Hadoock
Ezequiel
Grandes escritores da literatura
Potiguar são deixados de lado, sendo mencionados, muitas vezes, apenas como
nome de ruas ou cidades. Isso faz com que as obras de nossos autores sejam
esquecidas. Embora algumas sejam lembradas, como é o caso da escritora Nísia
Floresta, a maioria da população não tem informações sobre sua obra literária.
Nísia
Floresta Brasileira Augusta, ou Dionísia Gonçalves Pinto (pseudônimo), nasceu
no sítio Floresta, em Papari, atual Nísia Floresta - RN, em 1810. Filha de
Dionísio Gonçalves Pinto Lisboa e Antônia Clara Freire, viveu 28 anos na
Europa, sendo autora de vários livros, sendo publicados em português, francês e
italiano.
Além
de escritora, Nísia lutou pelas causas feministas de sua época. De 1838 a 1855,
“manteve um Colégio para meninas no Rio de Janeiro, com nome de Colégio
Augusto, que competia com os melhores da cidade, todos dirigidos por educadoras
estrangeiras”. (DUARTE e MACÊDO, p. 37, 2001)
Sendo
à frente de seu tempo, Nísia foi a primeira mulher brasileira a publicar em
jornais. Desde de 1830 é possível encontrar suas colaborações no jornal O
Espelho das Brasileiras, de Recife (PE). Lutando pelos direitos das
mulheres, a autora escreveu seu primeiro livro, dando o título de Direitos das
mulheres e injustiça dos homens, sendo também o primeiro, no Brasil, a tratar
do tema, e que tratava as mulheres como “seres inteligentes e cidadãs,
merecedoras de respeito”. (DUARTE e MACÊDO, p. 37, 2001)
O
livro em questão, teve como inspiração a obra de Mary Wollstonecrafaft, a primeira
inglesa feminista. No livro, a autora, apresenta os principais preconceitos
presentes no Brasil com relação à mulher, desmistificando a ideia de
superioridade masculina. Além desse livro, ainda publicou as seguintes obras: Conselhos
à minha filha (1842), Opúsculo humanitário (1853), A mulher
(1859), Fany ou o modelo das donzelas e Daciz ou a jovem completa
(1847).
Além
do tema sobre o direito da mulher, Nísia também abordou questões relacionadas
ao índio, sendo pioneira nessa área. “No poema intitulado A lágrima de um
Caeté, encontram-se interessantes posicionamentos da autora diante da estética
romântica, como a lusofobia, o elogio da natureza e a exaltação de valores
indígenas”. (DUARTE e MACÊDO, p. 38, 2001).
Nísia
era uma aventureira, gostava de viajar pelo mundo, conhecendo diferentes
culturas. Pela Europa, viajou por Portugal, Itália, Alemanha, Bélgica, Grécia,
França e Inglaterra. Nesse percurso, a autora teve a oportunidade de conhecer
escritores renomados da literatura como Alexandre Herculano, Victor Hugo entre
outros.
Nísia
faleceu no ano de 1885, em Bonsecours, nos arredores de Rouen, na França,
vítima de complicações pulmonares. Só no ano de 1954, por meio do Governo do
Rio Grande do Norte, seus restos mortais foram trazidos para o estado. “Entre
missas, discursos e bandas de músicas, em 12 de setembro, realizou seu enterro
em mausoléu construído em Papari, que, aliás, já havia mudado de nome em
homenagem à filha mais ilustre”. (DUARTE e MACÊDO, p. 39, 2001)
Trago
aqui alguns trechos do poema A lágrima de um
Caeté, para que os leitores possam conhecer mais um pouquinho sobre a obra dessa
nossa ilustre escritora potiguar, que precisa ser mais conhecida pela sociedade
do Rio Grande do Norte. Passemos à leitura:
A
LÁGRIMA DE UM CAETÉ
Lá
quando no Ocidente o sol havia
Seus
raios mergulhado, e a noite triste
Denso
ebânico véu já começava
Vagaroso
a estender por sobre a terra;
Pelas
margens do fresco Beberibe,
Em
seus mais melancólicos lugares,
Azados
para a dor de quem se apraz
Sobre
a dor meditar que a Pátria enluta!
Vagava
solitário um vulto de homem,
De
quando em quando ao céu levando os olhos
Sobre
a terra depois triste os volvendo...
Não
lhe cingia a fronte um diadema,
Insígnia
de opressor da humanidade...
Armas
não empunhava, que os tiranos
Inventaram
cruéis, e sob as quais
Sucumbe
o rijo peito, vence o inerte,
Mata
do fraco a bala o corajoso,
Mas
deste ao pulso forte aquele foge...
Caía-lhe
dos ombros sombreados
Por
negra espessa nuvem de cabelos,
Arco
e cheio carcaz de simples flechas:
Adornavam-lhe
o corpo lindas penas
Pendentes
da cintura, as pontas suas
Seus
joelhos beijavam musculosos
Em
seu rosto expansivo não se viam
Os
gestos, as momices, que contrai
A
composta infiel fisionomia
Desses
seres do mundo social,
Que
devorados uns de paixões feras,
No
vício mergulhados falam outros
Altivos
da virtude, que postergam
De
Deus os sãos preceitos quebrantando!
Orgulhosos
depois... ostentar ousão
De
homem civilizado o nome, a honra!...
Não
era um homem destes o que lá
Solitário
vagava meditando,
Como
aquele, que busca uma lembrança,
Uma
idéia chamar, que lhe recorde
Um
fato anterior da vida sua,
Vivamente
um lugar, que já foi seu,
Do
qual o Despotismo o despojara...
Era
um homem sem máscara, enriquecido
Não
do ouro roubado aos iguais seus,
Nem
de míseros africanos d’além-mar,
Às
plagas brasileiras arrastados
Por
sedenta ambição, por crime atroz!
Nem
de empregos que impudentes vendem,
A
honra traficando! o mesmo amor!!
Mas
uma alma, de vícios não manchada,
Enriquecida
tinha das virtudes
Que
valem muito mais que esses tesouros.
Era
da natureza o filho altivo,
Tão
simples como ela, nela achando
Toda
a sua riqueza, o seu bem todo...
O
bravo, o destemido, o grão selvagem,
O
Brasileiro era... - era um Caeté!
Era
um Caeté, que vagava
Na
terra que Deus lhe deu,
Onde
Pátria, esposa e filhos
Ele
embalde defendeu!...
É
este... pensava ele,
O
meu rio mais querido;
Aqui
tenho às margens suas
Doces
prazeres fruído...
Aqui,
mais tarde trazendo
Na
alma triste, acerba dor,
Vim
chorar as praias minhas
Na
posse de usurpador!
(...)
Ó
terra de meus pais, ó Pátria minha!
Que
seus restos guardando, viste de outros
Longo
tempo a bravura disputar
Ao
feroz estrangeiro a Pátria nossa,
A
nossa liberdade, os frutos seus!...
Recolhe
o pranto meu, quando dispersos
Pelas
vastas florestas tristes vagam
Os
poucos filhos teus à morte escapos,
Ao
jugo de tiranos opressores,
Que
em nome do piedoso céu vieram
Tirar-nos
estes bens que o céu nos dera!
As
esposas, a filha, a paz roubar-nos!...
Trazendo
d’além mar as leis, os vícios,
Nossas
leis e costumes postergaram!
(...)
Indígenas
do Brasil, o que sois vós?
Selvagens?
os seus bens já não gozais...
Civilizados?
não... vossos tiranos
Cuidosos
vos conservam bem distantes
Dessas
armas com que ferido tem-vos
De
sua ilustração, pobres Caboclos!
Nenhum
grau possuís!... Perdestes tudo,
Exceto
de covarde o nome infame...
Referências
DUARTE, Constância
Lima; MACEDO, Diva
Maria Cunha Pereira
de. (Org.) Literatura do
Rio Grande do
Norte. 2. ed. Natal:
Fundação José Augusto
/ Governo do Esta do Rio Grande do Norte, 2001, p. 37-38.
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